23 de ago. de 2010

Infortúnios da água

Coisa tão natural para nós que vivemos no meio urbano: abrir a torneira. De onde vem a água?Não importa. Mas quando tão simples ato é ameaçado quando a conta não é paga?
Dia 25, pagamento, costumava levar as contas do mês e quitá-las em seu caminho de volta, conferiu pela milésima vez as papeladas opressoras e contou os centavos, pois jamais deixava troco para operadores de caixa. Pagou tudo como fazia há anos e nem sequer se deu conta de sua falta de atenção, quando ao chegar a casa foi questionado pela esposa:
- Pagaste tudo?
Respondeu mecanicamente:
-E alguma vez deixei de fazê-lo?
A esposa franziu o cenho e voltou à cozinha. Julinho, filho adolescente, estava no sofá entregue ao seu novo hábito, adquirido recentemente, diga-se de passagem, livros de vampiros. Ele, o pai, achava aquilo uma boiolice, mas que pai seria se criticasse o interesse do filho pelos livros... Paciência.
Após o jantar a esposa voltou novamente ao assunto, como que para irritá-lo.
-Me entregue o recibo das contas sim?
Após um longo suspiro ela tenta ser gentil:
-E por que esse interesse tão repentino? Acaso queres se oferecer a pagar as próximas?
Vermelha por vergonha ou humilhação, manteve o mesmo tom inquisidor:
- Dê-me para guardar. Imagina se há algum erro nos computadores da loteria e o pagamento não é registrado, podemos ficar sem luz ou sem água...
O último argumento era quase um desespero, e após refletir ele acabou cedendo. E ela guardou todos os recibos, todas as contas pagas, sentia-se orgulhosa como se ela tivesse pagado com seu próprio dinheiro.
No mês seguinte a surpresa. Não há água na torneira, no chuveiro, na descarga... Ela pega o telefone:
_Alô, que absurdo é esse, como espera que possamos ficar sem água? Exijo um reparo imediatamente!
Uma atendente comum, com voz bonita e texto ensaiado, exerce seu trabalho no outro lado da linha, acostumada a grosserias, responde com a maior paciência:
-“...”
_Como não podem? Nós pagamos as contas todos os meses!
-“...”
- Como não registraram pagamento! Eu tenho o recibo sua incompetente!Processo em vocês!Ouviu bem!
Desliga o telefone como se o próprio aparelho tivesse culpa, ruma em direção aos recibos guardados tão carinhosamente e não encontra, revira novamente: nada de conta d’água. “Opa”.
Acorda o marido:
-Por que não pagaste a conta de água miserável!Deixar sua família sem água!Teu covarde imundo!
Ele meio dormindo meio acordado:
-Está louca mulher?Que absurdo é esse que falas?Pago todas as contas sempre, coisa que você bem poderia ajudar arrumando um emprego!
Engolindo em seco nova humilhação debate:
-Pois desta vez erraste!Cá não está o recibo da conta de água, onde enfiaste? Tu não passas de um inútil!
Obviamente ele nunca admitiria que estava passando tal humilhação por um bobo esquecimento, reviraram os dois os recibos, pastas, gavetas : nada.
Pensou em ouvir insultos da mulher durante o resto ano, de certo havia perdido a tal conta, já que tê-las com ele era de sua responsabilidade, pensou, algo o atingiu:
-Mulher! Não imaginas o que aconteceste!Eu estava lendo um dos livros do Julinho!Livro fascinante aquele... E devo ter posto a conta lá dentro, com certeza foi isso!Acorde o Julinho e mande-o que traga o tal livro que ele estava lendo deitado no sofá certo dia, a conta está lá dentro...

Bruna A. 08/08/2.010

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